Por Ana Paula Acauan (texto) e Bruno Todeschini (fotos) *
Tibério Ramos, 66 anos, deixou a redação de jornal há duas décadas, mas escreve como nunca, no dia a dia e nas férias. Tem um espaço em casa (e na praia de Guarani, em Capão da Canoa) para guardar seus livros e produzir ensaios, novelas e romances. Tudo em volta de uma mesa de sinuca. Ele, que adora fazer frases de efeito, adotou os dizeres do argentino Jorge Luiz Borges: “Prefiro ler a escrever porque leio o que quero, escrevo como posso.” Publicar os guardados se torna uma tarefa árdua. Leva anos e anos corrigindo os próprios textos até a decisão de entregar à editora.
− Eu me preparei para ser jornalista. Na faculdade, sempre procurei ensinar o que sei e aprendi. Escrever é retomar uma vida individual, de absoluta solidão. No máximo uma musiquinha e um chimarrão. Um momento de masoquismo. Tu sempre achas que não está bom, te preocupas com que as pessoas vão pensar.
Repórter de jornal desde 1969, resolveu diminuir o ritmo no fim dos anos 80. Sobravam horas e sua escolha foi fazer literatura. Lançou “Acrobacias no Crepúsculo” apenas em 2012. “Tenho romances que nunca vou tocar. Sempre questionei a qualidade até que, em 2006, pensei escrever um ‘para o bem e para o mal’”, afirma. Com sua saída de Zero Hora, em 1992, ficou com as aulas na Faculdade de Comunicação Social (Famecos), onde leciona desde 1977, e com mais tempo ainda.
Produzir exige muito estudo e buscar no Google. “Sombras Douradas”, por exemplo, se dá em dois tempos (séculos 16 e 21); um marcado pelo Renascimento e o outro pela tecnologia. “Quero concluir que o primeiro foi mais inspirador para o mundo. Mas eu não teria conseguido escrever se não fosse a tecnologia. Sou alguém confinado em Porto Alegre, Alegrete, numa praia deserta, que é Guarani. Hoje, através da Internet, posso saber como eram os personagens. Ou teria de ir no Louvre.”
Tibério passou a maior parte de sua carreira como repórter ou editor de Polícia. O incêndio das Lojas Renner foi um dos fatos que mais o marcaram. “Vi gente se atirando do prédio. Na edição das 11h da Folha da Tarde, eram 25 mortes. Na segunda tinha subido para 40. A gente ia para a redação para atualizar. Eram outros tempos.” Numa coincidência trágica, saiu um dia para cobrir um crime e descobriu que a vítima era o próprio irmão, assassinado aos 17 anos na Avenida Mauá. Ficou um período em outras editorias, mas acabou voltando.
O pai, Gaudêncio Ramos, trabalhou mais tempo no Correio do Povo do que ele. Foi correspondente em Alegrete por 24 anos. Apaixonado por aviação, pilotou até os 80 (morreu aos 92) e deu nome ao aeroporto da cidade. “Quando gurizote, era difícil entender e mais ainda explicar: meu pai não tinha carro, mas tinha avião.” Uma viagem inesquecível foi a carona até Alegrete, quando estudava jornalismo na Famecos, em 1968. “Cada vez que chego no Salgado Filho, me lembro do aviãozinho estacionado. Não sei como foi parar lá”, ri. O avô materno, Eduardo Vargas, que foi tabelião e prefeito de Alegrete, legou ao neto o gosto pelos livros e pelo trabalhismo de Leonel Brizola.
Quando estava no Científico, preparava-se para Engenharia. Um teste vocacional mudou seu rumo. Foi numa redação que conheceu a mulher. Tem um filho, jornalista, e uma neta, formada em História. Vai seguidamente a Alegrete, onde conserva a casa da família, sem deixar de, no mesmo período, visitar a mãe de 96 anos, em Florianópolis, senão ela fica com ciúmes. No interior gaúcho, recupera as energias. Nas últimas idas a Alegrete, recebeu homenagem na Feira do Livro.
(*) Perfil publicado à página 50 da Revista PUCRS, nº 176, edição de Setembro-Outubro 2015. Publicação bimensal editada pela Assessoria de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, com 33 mil exemplares. Versão digital em www.pucrs.br/revista.