Toda de preto atrás da vidraça. Um véu encobre o rosto. Sem família, sozinha. As vizinhas a viam antes com reservas, mas reformularam conceitos. Enquanto o marido viveu, foi, diríamos, volúvel, mas ao perdê-lo, convence: triste viúva, fiel à sua memória.
Outrora despertou inveja e despeito femininos. Fim de tarde, Berenice esperava, na janela, o esposo retornar da repartição. Saída do banho, fresca e perfumada, debruçava-se no parapeito, emprestando à palavra seu verdadeiro sentido. Os últimos raios pálidos do sol iluminavam os seios apertados contra a madeira antiga, a saltarem no decote ousado. “Sirigaita, podia usar um vestido mais decente”, recriminavam, à época, em jogral, as senhoras. Os cavalheiros, ao contrário, não revelavam qualquer contrariedade. Encantados com a sensual dama à janela, retiravam o chapéu, desdobrados em cumprimentos. Educada, respondia a todos, um sorriso gracioso; e discriminava alguém ao piscar os olhos. Abanava com a ponta dos dedos quando Torquato apontava na esquina – terno surrado, o nó frouxo da gravata estreita. Pulava até a porta para recebê-lo em abraço cheiroso, macio e quente.
– Muito cansado, querido? – preocupava-se com a saúde do marido.
A cada dia, aumentavam suas olheiras profundas. Trabalhava em dois expedientes, nem tempo de almoçar em casa. Voltava do serviço morto de cansado. Saía do banho de pijama.